quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Epístola ao paganismo que se apelida Cristão (Natal de 1953)

Dedicatória de Plínio Salgado a Antonio Salem (antigo membro da Câmara dos Quarenta da Acção Integralista Brasileira)

Plínio Salgado

Homens e mulheres do Ocidente, adeptos de todas as crenças que se dizem cristãs, frequentadores das igrejas católicas e das igrejas ortodoxas, anglicanas, metodistas, presbiterianas, batistas, evangélicas e quantas mais vieram da Reforma, e ainda outras que, sob os prismas mais diversos, inspiram-se em Cristo nestes tempos calamitosos; ouvi a palavra do Dr. E. W. Emgstrom, vice-presidente da “Radio Corporation of America”.

Nenhuma ocasião é mais propícia a essa palavra do que a noite em que celebrais, segundo os vossos costumes, com presépios ou árvores resplandecentes de lantejoulas, com  as mercearias iluminadas e pejadas de nozes, castanhas, figos e uvas, e vinhos de todas as qualidades, o aniversário do nascimento de Jesus Cristo. Não importa que o Dr. Emgstrom haja falado no curso do ano que finda. As suas palavras ganham oportunidade à passagem deste Natal. O que ele diz tem grande importância para a mitologia dos tempos modernos. Ele anuncia mais um deus ao politeísmo do século XX, tão rico em divindades novas e prestigiosas.

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O Dr. Emgstrom revela que a ciência e a técnica, à maneira de Erebo e da Noite, os dois filhos do Caos, depois de terem engendrado os vossos deuses-máquinas, esses deuses que se chamam o automóvel, o avião, o rádio, o calculador automático, o radar, o submarino, a bomba atômica, acaba de inventar um engenho eletrônico, dotado de pensamento e inteligência e capaz de sentir e reagir... E afirma, categoricamente: “O homem poderá construir, em sistemas eletrônicos, uma máquina capaz de o substituir".

Em seguida, prevendo o susto que vos assaltaria, ao imaginar que essa máquina, fabricada em série pelo Capitalismo Burguês ou pelo Estado Socialista, iria tornar-vos seres inúteis ou muito mais dispendiosos ou inconvenientes, o Vice-Presidente da “Radio Corporation of America” acrescenta:

“Entretanto, o que os eletrônicos podem executar tem um limite, embora ainda muito distante para ser conhecido presentemente. A mente humana, ao contrário, não tem limites e sendo o seu poder criador fundamental, o Homem continuará a ser sempre supremo, isto é, superior à máquina raciocinante”.

Confesso, homens e mulheres que vos dizeis cristão em nosso século, confesso não ter sentido nas palavras do grande técnico nenhuma consolação e tranquilidade. E isso porque observo, nestes últimos anos, um fato que ninguém pode contestar: enquanto as máquinas de ferro e de outros metais tendem a humanizar-se, executando os atos do Homem, o Homem tende a maquinizar-se, não somente se submetendo ao ritmo dos engenhos mecânicos e elétricos por ele próprio engendrados, mas, ainda, procurando conformar-se a sistemas de movimentos e de ações que anulam o potencial da sua personalidade. A máquina quer ser gente; o Ser Humano quer ser máquina.

Já não falo do ritmo do trabalho que se convencionou chamar racionalizado, mediante o qual a especialização reduz a Criatura de Deus aos limites de um isocronismo exasperante e aos acanhados espaços de funções restritas onde morre toda a possibilidade do poder inventivo. Já não falo do rebaixamento da pessoa humana reduzida a só mover uma determinada alavanca, ou a ligar e desligar uma corrente elétrica, ou a limar parafusos, ou a polir cilindros, ou a abrir roscas em porcas metálicas. Já não falo no automatismo das mãos conformadas à cadência do aparelho, como observou Gheorghiu no seu livro “A Vigésima Quinta Hora”.

Falo da mecanização crescente da vida social. Falo dos regimes políticos onde o Homem se torna peça na grande máquina do Estado. Falo nas planificações econômicas (é preciso distinguir planificação de planejamento), as quais fazem do Ser Humano um zero, enfileirado com outros zeros, cujo conjunto, à direita do algarismo significativo do Poder, eleva o potencial deste e em consequência sua maior tirania. Falo da concepção econômica da História e dos processos sociais, o que transforma os povos e os indivíduos em comunidades sem espírito e seres sem alma, submetendo-os aos impositivos  de irrevogável determinismo. Falo da concepção mecânica da inteligência, medida, pesada e contada pelo artifício dos “tests”, com abstração total da misteriosa complexidade e dos dificilmente reveláveis segredos da personalidade. Falo dos sistemas de fichas, a que todos se submetem, desde a ficha dactiloscópica à ficha nas policias, à ficha nos hotéis, à ficha nos bancos, à ficha profissional, que trazem o Rei da Criação perenemente vigiado, inquirido, suspeitado, humilhado. Falo dos mil impostos que os Governos cobram e através dos quais à vida do contribuinte é devassada, vasculhada, até mesmo o seu pudor domiciliar. Falo da psicanálise, essa nova superstição dos tempos modernos, que não respeita os sagrados recessos da alma humana, ultrapassando as fronteiras as dignidade e atentando contra as prerrogativas do Homem outorgadas por Deus. Falos dos modernos processos dos inquisitórios adotados na Rússia, com aplicação de drogas, como a mescalina, desintegradora da personalidade. Falo na substituição da “qualidade” pela “quantidade” no que concerne aos meios de representação nacional e eleição de governantes, o que transforma os povos conscientes em massas inconscientes, despidas de raciocínio e tangidas em grandes movimentos de rebanhos pelos detentores das máquinas de propaganda. Falo da ação mecanizadora da imprensa, do rádio, da televisão, do cinema,  que plasmam, um por um dos leitores, dos ouvintes, dos tele ouvintes, dos espectadores, uniformizando-os em opiniões, em gostos,  em comportamento, e fabricando com a matéria prima de seres personalizados, infindáveis séries de tipos “standard”, com idênticas atitudes, idênticas palavras, idênticos hábitos. Falo do critério exclusivamente funcional na arquitetura, que fez das casas do Homem simples máquinas de morar, destruindo toda a possibilidade do chefe e da mãe de família no sentido de imprimirem caráter próprio ao lar doméstico; ver um apartamento é ver todos: são caixas onde se guardam os “robots” que durante o dia executam as mesmas coisas que os outros “robots” executam. Falo dos excessos da interpretação social mediante os frios algarismos das estatísticas que consideram meros problemas matemáticos os dramas humanos mais pungentes e tiram conclusões do geral para o particular, conformando os mais variados e complexos, os mais típicos e específicos índices psicológicos pessoais ou grupais,  à teoria dos inexpressivos recenseamentos como uma terraplanagem de relevos característicos do solo.

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Uma voz denunciou ao mundo o perigo que representa esta tendência para a mecanização do Homem e da Sociedade. Foi Pio XII na sua Mensagem de Natal no ano passado. Impressionou-o o despotismo da Máquina sobre o Homem. “Esta incapacidade de dominar a máquina” – diz o Sumo Pontífice – “deveria sugerir aos homens, suas vítimas, a certeza de que não podem esperar a salvação unicamente dos técnicos da produção e organização”. Mais adiante, criticando as falsas teorias, que pretendem solucionar os problemas sociais e econômicos “mediante uma organização rigorosamente uniforme e inflexível”, Pio XII diz: “Pretender a salvação de fórmulas rígidas, aplicadas materialmente à ordem social, é uma superstição, porque é atribuir a essas fórmulas um poder prodigioso, que elas não têm”.

Mas vós, homens e mulheres do século XX, e particularmente homens e mulheres da Europa Ocidental e das Américas, que vos dizeis cristãos, nada quereis compreender. Servis a dois senhores, a Cristo e a Mamon. Dizeis que estais integrados no Reino de Deus, mas viveis segundo o Reino de Satã, o destruidor da personalidade humana. Aceitais todas as superstições contemporâneas. Criastes a Máquina mas em vez de dominá-la sois dominados por ela. O Comunismo Russo e o Capitalismo Ocidental, que são uma e a mesma coisa, pelas suas origens materialistas e seus objetivos exclusivamente temporais, impuseram-vos a adoração de novos deuses de aço. Esses deuses são mais perversos do que o das mitologias egípcia, assírio-babilônica, greco-romana, pois Osíris, Isis, Hórus, Anúbis, e Melkart, Ormuz, Bel-Marduk, e Júpiter, Saturno, Dionísio, Apolo, Vênus, esses pelo menos falavam de uma vida além dos limites deste mundo, ao passo que o deus Cadilac, o deu Douglas, o deus T.S.F., o deus Nautilus, o deus TV, e mil outros de aço que adorais, só vos falam da vida deste mundo. Os pagãos antigos eram mais dignos, porque não perdiam as prerrogativas de Seres Humanos; mas vós não só adorais, mas imitais os deuses-máquinas, conformai-vos ao seu ritmo, e pretendeis transformar a ordem social, a ordem política, a ordem econômica, a ordem moral em imensos maquinismos, onde não passais de peças e onde impera a cadência do todo em que vos integrais.

Tendes ainda uma inferioridade em face dos pagãos anteriores a Cristo. É que eles não tinham recebido a luz da Verdade, que vós recebestes há dois mil anos. Eles não tinham o que hoje tendes: a Redenção cujo preço foi o sangue de Cristo. Eles não haviam recebido a doutrina do Evangelho e vós a tendes recebido há vinte séculos.

O vosso castigo há de ser – se não vos modificardes – o Frankstein de que vos fala o Dr. Emgstrom. Ele irá tomar o vosso lugar. Seres despedidos pelo Comunismo ou pelo Capitalismo, os dois monstros do Apocalipse.

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Sob o critério materialista, a Máquina, é, em tudo, superior a vós. Em 1931, escrevi estas palavras que depois foram enfeixadas nos livros “O Sofrimento Universal” e “Madrugada do Espírito”:

“O monstro de aço conquistou mais do que a igualdade, a superioridade social sobre o homem. A máquina não tem pais e nem gera filhos; não vibra de afetos; não alimenta aspirações; não cultiva a moralidade. É, portanto, muito mais conveniente ao capitalismo universal. E é por isso que o Capitalismo quer arrancar do Homem os últimos resíduos espirituais, para que a massa proletária se transforme também num sistema de maquinismo...”.

E considerava: “O instinto da máquina vai avassalando tudo. A máquina exige que se modelem coletividades de movimentos automáticos, de formas geométricas precisas e cadências uniformes. Essas coletividades devem cristalizar-se nos fornos das necessidades, que irão obrigando cada tipo isolado a se acomodar ao grande ritmo cujo sentido é a mecanização total da existência. É a redução ao inanimado. A racionalização desracionalizante. O homem tipo como a máquina-tipo. O trabalho-mercadoria como o Quilowatt-hora. O índice de caloria dos combustíveis. O trabalho como finalidade do trabalho. A morte total do espírito”.

“O Homem inventou a máquina; a máquina agora, quer fabricar homens. E se um dia saírem homens das usinas, também os úteros das mulheres gerarão homens-máquinas, sem coração, sem afeto”.

Essas palavras foram escritas em 1931. E agora dois fatos as comprovam, neste 1953. O dr. Emgstrom anuncia o advento do Frankstein eletrônico. E as estatísticas revelam o número de crianças nascidas de inseminação artificial, pois nos Estados Unidos se marcha para a fabricação de homens de laboratório, cuja composição exige apenas a mulher como receptáculo de um sêmen anônimo, provindo do caos coletivo, sem história, sem relação com o sentimento em que se sublima, para honra da Espécie, o impulso sexual.

E, assim, homens e mulheres adoradores da Máquina, que vos dizeis cristãos e festejais o Natal Daquele que veio ao mundo para redimir o Ser Humano e dar-lhe noção de sua grandeza pessoal, esta mensagem que vos envio está cheia de dor dos que ainda pensam e raciocinam quando a maior parte de seus semelhantes abdicou as altas prerrogativas que Deus lhes havia outorgado. E essa dor, que se apura no fogo das meditações, eleva-se aos Céus em forma de prece, rogando ao Cristo, cujo nascimento comemoramos, que nos ajude, neste século, a libertar-nos da escravidão a que nos temos submetido, a fim de que nos arranquemos do pior dos paganismos que aterra já conheceu, e possamos, restaurando a Personalidade Humana, servirmos a um só Senhor e Deus, conforme nos ensinou o mesmo Jesus Cristo, ao dizer-nos que, para pertencermos ao seu Reino, cumpre-nos repudiar a Mamon, senhor do dinheiro e senhor das máquinas, escravizador e automatizador dos ritmos sociais em que se anulam os ritmos próprios de cada homem e de cada mulher, quando se esquecem da nobreza da sua origem e da glória de sua finalidade suprema.

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SALGADO, Plínio. A Tua Cruz, Senhor... Rio de Janeiro: Livraria Clássica Brasileira, 1954. Transcrito das páginas 115 até 124.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Verdades da "direita" e da "esquerda" (1933)


Plínio Salgado

Em vos falando da verdade, pergunto-vos: existe uma verdade da “direita” e outra da “esquerda”? Onde está a verdade? Como atingirmos a verdade?

Respondo-vos, dizendo que não existe uma verdade da “direita” ou da “esquerda”, porque no sistema do mundo,  na essência do cosmos, não existe nem “esquerda” e nem “direita”, e sim condições de movimentos e processos de expressão de forças eternas, de um modo imutável.

A Verdade está no Absoluto das coisas e nós a atingiremos pela Concepção Integral do Universo.

Eis aí como o nosso Integralismo supera todas as correntes de ideias que costumam evocar, para estabelecer comparações, os poucos versados em nossa doutrina.

Não nos limitamos ao terreno econômico e social, porquanto partimos da esfera filosófica e estabelecemos um sistema de consideração do mundo, segundo o qual subordinamos o nosso pensamento político. Esse sistema não se submete ao ângulo estreito das concepções unilaterais, nem tampouco se restringe ao agnosticismo debilitante da burguesia epicurista ou empírica.

O nosso pensamento tem o sentido expressivo deste século, cujo espírito os pensadores da Europa ainda não apreenderam. Esse  espírito é de Síntese.


SALGADO, Plínio. A Quarta Humanidade. 1. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1934; págs. 90 e 91. A passagem transcrita faz parte da Conferência “No Limiar do Século XX”, proferida originalmente na Faculdade de Direito de Recife (1933) e repetida na Associação Universitária da Bahia e no Teatro José de Alencar, em Fortaleza, e posteriormente enfeixada na Obra “A Quarta Humanidade”.

Opinião de Miguel Reale sobre Plínio Salgado (1978)


Em 14 de Maio de 1978, Miguel Reale dá uma entrevista na qual aborda o Integralismo e, como não poderia deixar de ser, fala sobre Plínio Salgado. Resolvi transcrever abaixo uma parte da mesma, para que todos constatem qual era a opinião do insígne Jurista sobre o nosso Chefe:

"Não fui um dos fundadores do Integralismo. O Movimento surgiu em Outubro de 1932, com o Manifesto de Plínio Salgado. Nessa ocasião, eu fazia oposição ao Integralismo. Sou conterrâneo de Plínio Salgado, nascemos ambos em São Bento do Sapucaí. (...) O Integralismo, a meu ver, não surgiu como uma expressão de mimetismo de fenômenos como o fascismo e muito menos o nazismo. Inicialmente, o Integralismo foi uma meditação sobre os problemas brasileiros, o que se pode ver pela obra de Plínio Salgado, como por exemplo, o seu romance "O Estrangeiro", que deveria merecer tanta atenção quanto "A Bagaceira", de José Américo de Almeida. Tanto na sua obra literária como na sua atuação política, Plínio reflete a meditação sobre a obra de Alberto Torres, Oliveira Vianna, Farias Brito, Tavares Bastos, Euclides da Cunha, que eram seus autores prediletos. De maneira que a sua formação inicial foi, digamos assim, cabocla. Aliás, sempre o considerei um grande caboclo, até pelo físico, pela maneira de ser.

"(...)

"Tomemos como exemplo Plínio Salgado. Ele tinha uma orientação eminentemente Católica. Sua formação política era baseada na doutrina social da Igreja, à qual se manteve vinculado até o fim. Isso, aliás, foi reconhecido pelos que na época falavam em nome da Igreja.

(...)

"Foi dito que ele" - Miguel Reale está se referindo a Plínio Salgado - "era um intelectual e acho que se manteve um intelectual até o fim. (...) Plínio Salgado era um político de cultura muito superior ao usual nos meios partidários. Cultura literária, filosófica e política. Era um temperamento irrequieto, um feixe de nervos, e com uma intuição fora do comum. Disse certa feita que a característica de sua inteligência era a intuição, que ele detinha um gênio intuitivo, (...). Prevalecia nele um poder de intuição próprio do brasileiro. Intuição dos problemas sociais, políticos e uma grande capacidade de apostolado. Foi sobretudo um homem que mobilizava inteligências e a opinião pública, capaz de falar tanto ao intelectual como ao homem do povo, porquanto sua palavra vinha carregada de afetividade e sentimento. Jamais acreditou na direção do país tão-somente com ideias puras, ou seja, com ideias apenas através de conceitos. E sentia a necessidade de governar lançando mão também dos elementos de comunicação, que envolvem sem dúvida aspectos afetivos. Era inegavelmente um homem que tinha uma dedicação à causa brasileira que não pode ser contestadas.

"Essa é a imagem que guardo de Plínio Salgado: um autodidata que passou do plano literário para o plano político sem solução de continuidade. Toda a sua doutrina política está nos seus romances. Se fizermos uma análise de sua obra literária, verificaremos como o literato passou de uma atitude puramente estética para outra de caráter político. Apesar de toda essa apresentação que corre por aí de um homem violento, Plínio Salgado no fundo era um tímido, e os que conviveram com ele sabem disso. Posso dizer-lhes que o Integralismo se preparou para tudo, menos para a conquista violenta do poder. "


MOTA, Lourenço Dantas. A História Vivida (I): [entrevistas]. [2. ed.]. São Paulo: O Estado de São Paulo, 1981. A Entrevista de Miguel Reale encontra-se entre as páginas 321 e 345. As passagens transcritas foram retiradas das páginas 324, 325, 327, 334 e 335.

Opinião de Gustavo Barroso sobre Plínio Salgado (1937)


No dia 11 de Junho de 1937, as Cortes do Sigma proclamaram solenemente Candidato da Acção Integralista Brasileira à Presidência da República ao Chefe Nacional Plínio Salgado.

O discurso de encerramento daquela histórica Solenidade foi proferido por Gustavo Barroso, Secretário Nacional de Educação da A.I.B., em meio ao qual declarou o seguinte sobre o Chefe Nacional Plínio Salgado:

"Reparae - exclama o orador - a grande differença que existe entre o Chefe Nacional e os chefes dos outros movimentos, não iguaes, mas parallelos. Todos esses movimentos tiveram os seus precursores e os seus realizadores.
"No Brasil não há precursores. Plínio Salgado é o primeiro e o único".


("Monitor Integralista", Rio de Janeiro, 17 de Junho de 1937, Anno V - Num. 21 - págs. 3. Foi conservada a ortografia do original)

Considerações a respeito do artigo "Plínio Salgado e a Ação Integralista Brasileira" (2010)


Victor Emanuel Vilela Barbuy

O prestigioso jornal O Lince, do Município de Aparecida-SP, veículo no qual tenho tido, aliás, a imensa honra de colaborar, publicou, na última edição, artigo da lavra do Sr. Leandro Pereira Gonçalves, a respeito de Plínio Salgado e a Ação Integralista Brasileira, que merece alguns reparos e esclarecimentos.

Em primeiro lugar, ao definir o Integralismo como sendo um movimento “essencialmente autoritário”, o autor deveria ter explicado o verdadeiro significado do termo “autoritário”, que diz respeito àquele que afirma o princípio de Autoridade, pressuposto da Ordem e da Liberdade, nada tendo que ver com arbitrário e, menos ainda, com totalitário.

Isto posto, cumpre ressaltar que, se, por um lado, Plínio Salgado (que nasceu em 1895 e não em 1885), como expôs o autor, se entusiasmou com as realizações de Mussolini na Itália – como, aliás, tantos homens de seu tempo, de Fernando Pessoa a Chesterton, de Ezra Pound a Mircea Eliade, de Emil Cioran a T.S. Eliot, de Hilaire Belloc a Knut Hamsun, de Oswald Mosley a José Antonio Primo de Rivera, de Céline a Carl Schmitt, de Drieu La Rochelle a Octavio de Faria, de Charles Maurras a Hendrik de Man, de Maurice Barrès a Whyndham Lewis, de Corneliu Codreanu a Alceu Amoroso Lima, de Gandhi a Winston Churchill -, por outro, ele jamais deixou de condenar certos aspectos da doutrina fascista e de ressaltar as diferenças existentes entre esta e o Integralismo, sobretudo no que diz respeito à concepção de Direito e de Estado.

Registre-se, ademais, que, ao contrário do que afirmou o Sr. Leandro Gonçalves, o Integralismo jamais pregou um “nacionalismo agressivo que impusesse a hegemonia brasileira na América do Sul”. Ao contrário, o Integralismo sempre defendeu um nacionalismo sadio e edificador, ou, como diria o próprio Plínio, “equilibrado e profundo, justo e lúcido”¹, e sustentou a integração harmoniosa do Brasil com seus vizinhos. Com efeito, já em 1934, em A Quarta Humanidade, Plínio Salgado pugnava pela formação de uma verdadeira confederação latino-americana, sustentando a necessidade da “união mais íntima entre os americanos meridionais” e da “suspensão de todas as barreiras alfandegárias entre esses povos e o mais íntimo intercâmbio cultural e espiritual”².

Quanto ao Ministério da Educação, oferecido por Getúlio Vargas a Plínio Salgado ou a quem por ele indicado, cumpre ressaltar que o autor de O estrangeiro o recusou, sendo então indicado Gustavo Barroso para tal Ministério, por decisão de líderes da Ação Integralista Brasileira. Mas o Ministro da Justiça, Francisco Campos, encarregado de transmitir a decisão a Vargas, acabou não o fazendo, de modo que o Ministério da Educação acabou indo para as mãos de Gustavo Capanema, que não pertencia à AIB.

Isto posto, é forçoso sublinhar que, ao contrário do que afirmou o Sr. Leandro Gonçalves, o Levante de 11 de Maio de 1938 não foi “um levante promovido pelos integralistas com o objetivo de liquidar Vargas”, mas sim uma precipitação do Movimento que, reunindo integralistas, liberais e militares descontentes, pretendia depor e prender Vargas e restaurar a Constituição de 1934 e o regime democrático. Com efeito, tal levante representou, como reconheceu o historiador Glauco Carneiro, a única reação armada contra a ditadura estadonovista até a deposição de Vargas, em 1945³.

No que tange ao Partido de Representação Popular (PRP), insta assinalar que, ao contrário do que afirmou o Sr. Leandro Gonçalves, não foi Plínio Salgado quem criou esta agremiação após seu retorno ao Brasil, em 1946, mas sim um grupo de militantes integralistas, em 1945. Ademais, tal partido não teve participação tão tímida na vida nacional quanto alega o Sr. Leandro Gonçalves, havendo, com efeito, elegido diversos Deputados Estaduais e Federais, Vereadores, Prefeitos e mesmo um Governador (Jorge Lacerda, de Santa Catarina), sendo importante frisar, ainda, que, em 1955, quando candidato à Presidência da República, Plínio Salgado foi o candidato mais votado no Paraná e teve votação expressiva em diversas outras províncias brasileiras.

Por derradeiro, cabe enfatizar que, diversamente, uma vez mais, do que afirmou o Sr. Leandro Gonçalves, Plínio Salgado não “apoiou de maneira incondicional” o regime instaurado a partir de 1964, havendo se oposto, por exemplo, ao Ato Institucional nº 2, de 1965, que extinguiu todos os partidos até então existentes.

Notas:
1 SALGADO, Plínio. O pensamento revolucionário de Plínio Salgado (antologia organizada por Augusta Garcia Rocha Dorea). 2ª ed. ampl. São Paulo: Voz do Oeste, 1988, p. 97.
2 Idem. A Quarta Humanidade. 1ª ed. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1934, p. 79.

3 CARNEIRO, Glauco. História das revoluções brasileiras. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora Record, 1989, p. 360.

Breve Histórico sobre "A Mulher Nua", de Plínio Salgado

Capa da 1ª edição (1956) do "Livro Verde da Minha Campanha".

Sérgio de Vasconcellos

No Carnaval de 1948, a célebre naturista Luz del Fuego, compareceu ao tradicional baile de Carnaval do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, patrocinado pela Prefeitura do então Distrito Federal, em trajes de “Eva”, apenas com uma serpente de fantasia enrolada no corpo... Indignados com tamanha demonstração de impudicícia, os diretores do Baile, arvorados em defensores dos valores morais, expulsaram a foliã. Como era de se esperar a imprensa, explorou avidamente o acontecido, publicando muitas fotografias reveladoras...

Diante de tanto farisaísmo, Plínio Salgado escreve um artigo de jornal, “A Mulher Nua”, uma das mais belas e duras páginas da Literatura Brasileira, denunciando de forma contundente o falso moralismo e a hipocrisia da sociedade brasileira, mais revoltantes que o nudismo escandaloso da carnavalesca.

Em 1950, Luz del Fuego, sem o consentimento de Plínio Salgado, publica o citado artigo no seu hoje raríssimo livro “A Verdade Nua”.

O próprio Plínio Salgado incluiu, como um capítulo, aquele seu artigo no livro “O Espírito da Burguesia”, editado em 1951 e, posteriormente, na obra “O Livro Verde da Minha Campanha”, que é de 1956.

Tudo continuaria no melhor dos mundos possíveis, se Plínio Salgado não resolvesse confrontar mais uma vez a burguesia brasileira, lançando-se Candidato à Presidência da República, nas eleições de 1955.

Não tendo o que dizer do Fundador do Integralismo, homem de extremada correção moral, os inimigos do Brasil optaram por trazer à baila aquele artigo, acusando Plínio Salgado de imoral e defensor do nudismo. Diariamente, a “grande imprensa” falava de “A Mulher Nua”, evidentemente sem transcrevê-lo, e distorcendo o seu conteúdo. Uma campanha de difamação sem precedentes na história política nacional.

Entre os que se empenharam nesta sórdida e repugnante campanha, achava-se o escritor Gustavo Corção, ainda na esquerda Católica, que tinha dois motivos para encarniçar-se contra o Autor da “Vida de Jesus”, um pessoal e o outro político:

Em 1948, Plínio Salgado fora convidado pelo Bispo Dom Ballester Nieto, por indicação do Vaticano, para participar das Conversações Católicas Internacionais de San Sebastian, que tinham por finalidade elaborar um documento que seria a contribuição da Igreja Católica à Declaração Universal dos Direitos Humanos, da ONU. Sobre esta experiência, Plínio Salgado escreveu o magnífico livro ”Direitos e Deveres do Homem”, cuja leitura recomendamos a todos os Brasileiros. Pois bem, o Sr. Corção, que tinha a firme convicção, dado ser um dos líderes do laicato católico, que seria ele o convidado para representar a inteligência católica brasileira naquela prestigiada reunião, jamais perdoou Plínio Salgado por ter sido o escolhido, uma afronta...

Além desse injustificado ressentimento, o sr. Corção apoiava ao cripto-comunista Juarez Távora, também candidato à presidência pelo PSB.

Vários líderes religiosos vieram a público defender Plínio Salgado daquelas falsas acusações, mas vejamos apenas o que declarou Dom Antônio Lustosa, Arcebispo de Fortaleza: “Conheço o artigo de Plínio Salgado sobre o nudismo. Trata-se de uma clara condenação à decadência dos nossos costumes sociais. Considerar o artigo favorável ao nudismo é não entendê-lo ou, então, vira-lo ao avesso. Aliás, a vida do ilustre escritor é incompatível com a doutrina pagã que o artigo verbera.”


Os que desejarem conhecer o relato do próprio Plínio Salgado sobre este episódio deverão ler o “Livro Verde da Minha Campanha”, obra em que faz um balanço daquela sua campanha presidencial, e onde, no capítulo XI, trata do assunto.

A Mulher Nua (1948)


Plínio Salgado

Uma revista, dessas que exibem o nu artístico às donzelas casadouras e às meninas da Primeira Comunhão, publicou há dias, numa página inteira, a foto sugestiva de uma garota carnavalesca em trajes de Eva, com uma serpente de flores enroscada no alvo torço de Frinéia ondulante no ritmo do samba, como Afrodite a sair da concha do Mar Egeu.

A legenda participava aos leitores que a esplêndida ninfa - não sem os protestos gerais dos foliões - fora expulsa do Teatro Municipal pelo fato de erigir-se, naquele pudico e recatado ambiente de virtudes burguesas, como uma nota viva de escândalo a ferir a sensibilidade castíssima da grã-finagem carioca.

Vendo-se assim repelida pelas tradicionais virtudes da raça e pelos incontestáveis sentimentos cristãos que animam os folguedos de Momo nos três dias das bacanais e saturnais em que desafogam seu tédio as famílias, a sílfide resolveu sair, mas sair dançando. E de tal forma se portou nos movimentos coreográficos da retirada estratégica, desmanchando-se em reboleios de ritmos tão eloquentes, que um trovão de aplausos saudou-a no saguão daquele templo de castidade em que se transformara o teatro principal do Rio, à falta de um autêntico santuário de Vesta.

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A fotografia era expressiva e convidava a meditar sobre as possíveis intenções da heroína desnuda.

De mim, confesso que o nudismo de tão ousada bailadeira não me pareceu imoral: antes, pelo contrário, interpretei-o como verdadeira pregação apostólica em prol da moralização dos nossos costumes.

Que fez a jovem carioca, naquela noite de tão esplêndido triunfo para a sua beleza corpórea, senão deduzir, da premissa burguesa do nosso cristianismo paganizado, a consequência lógica diariamente encoberta nas malhas dos sofismas com que se absolve de culpas o nosso mundo de hoje?

Muitos modos há de apostolizar consoante a inspiração do pregador e a psicologia do gentio cuja catequese se pretende. Uns se valem da palavra e outros dos atos e atitudes. E tanto os sermões verbais como os que se ministram à força de exemplificações variam na forma, estilo, timbre e mais originalidade que o gênio cria como instrumento de persuasão.

Contra os desmandos orgíacos de Roma, utiliza-se Catão da sua austeridade, e ainda que autores desconfiados vislumbrem nas admoestações do censor algumas frestas a entremostrar mal dissimulada hipocrisia, o terrível repúblico ficou a simbolizar, quando não a sinceridade de propósitos, pelo menos um método no aplicar corretivos.

O risco a que se expõem esses pedagogos, demasiadamente severos e amigos da ordem direta nas suas proposições morais, é a de serem tachados de refinados mistificadores. E não somente na pena dos críticos antigos, mas sobretudo na dos modernos, que jogam hoje com os dados da psicanálise para transformar em despeito de incapazes e fracassados as advertências dos moralistas.

Para os tais psicanalistas, se um homem aconselha a outro que não roube, é porque no íntimo sente inveja do ladrão, que é um indivíduo capaz de praticar o delito que o conselheiro não se sente com coragem de efetivar; se outro (ou outra, como no "Electra" de O'Neil, que é uma das mais edificantes bandalheiras do teatro moderno) sente repugnância pela atração incestuosa de alguém, é porque no fundo sofre o mesmo magnetismo pela sujeira; enfim, qualquer sujeito, que pugne pela moralidade dos costumes, vai para o catálogo dos freudianos como tipo a disfarçar a inveja de quantos destapam as comportas dos instintos.

Fica, assim, destruída toda a moralidade privada ou pública e os Batistas que pretendem corrigir as Herodíades e Salomés passam por indivíduos recalcados a pretender que outros se recalquem. Não faltarão aos moralistas, já não dizemos a cicuta de Sócrates, a fogueira de Savonarola, a Cruz de Cristo, mas as críticas mordazes e os motejos ridicularizantes, em nome da ciência e do progresso.

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Ora, assim pensando (ou não pensando coisa alguma como é mais provável em pedagogia puramente intuitiva) a garota do Municipal teria resolvido mostrar, em todo o esplendor da sua carne jovem, o verdadeiro motivo que reunia, naquele templo de pudicícia carnavalesca, os pais, os rapazes e as moças de família.

Inverteu ela, assim, os papéis. Em vez de ser apontada como hipócrita, desmascarou a hipocrisia da sociedade católico-pagã de donzéis e donzelas das missas de domingo e das praias pompeianas da talassoterapia e da heliopigmentação em que se espojam Ganimedes e Safos desabafando complexos e afinando o instrumental endocrínico nos extremos opostos dos recalques ultraistas de pasmosos assexualismos com que o charlatanismo científico pretende contrabater o conceito realista da filosofia verdadeiramente cristã.

Em vez de, (caso ali comparecesse a pregar um sermão de refundir Tibérios e Messalinas em forjas cândidas) em vez de arriscar-se a ouvir de algum folião ou foliona o epíteto de hipócrita, foi ela, a náiade pagã, quem atirou à face da plutocracia e da burocracia, que comandam a saturnal dos nossos dias, o mais veemente dos discursos que jamais boca de frade ousou jorrar de púlpitos ainda os mais atrevidos no escalpelar ulcerações ou esvurmá-las a ferro em brasa.

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Nua, inteiramente nua, como Frinéia diante dos juízes de Atenas, a nossa patrícia dançando o samba e rebolando as curvas afrodisíacas, exclamava em linguagem coreográfica:

- Acaso é a castidade que vos reúne aqui? Porventura estas músicas lascivas vos sugerem, ó velhos de Babilônia, ideias e pensamentos arcangélicos e visões puríssimas do Empíreo? E vós, Adônis e Narcisos, travestidos de roupas femininas, alimentais fantasias menos lúbricas do que as de Heliogabalo ou de Calígula quando cingiam roupagens de Vênus ou de ninfas, de tal maneira alucinados pelo fascínio das formas opostas ao seu sexo, que procuravam identificar-se cerebralmente com elas? E vós, Faunos e Sátiros espiritualmente caprípedes, farejando os perfumes mesclados ao odor dos suores femíneos, pretendeis renovar a façanha de Santo Antão no deserto, a resistir varonilmente às tentações envolventes? E vós, Virgens que ledes os romances analistas e as poesias eróticas da nossa época, e assistis aos filmes de longos beijos que galvanizam as plateias escuras e povoadas de tatos sutilíssimos, estais aqui por acaso para rezar ave-marias ao ritmo das músicas bárbaras? E vós, matronas que vos confundis com vossas netas e filhas na indumentária e nas atitudes, comparecestes a este lugar nada litúrgico para, pelo menos, vos engolfardes no romantismo daquelas velhas valsas que falavam em doçuras de líricos amores e devaneios castíssimos de heroínas de novelas antigas? E ainda todos vós, que mergulhais na onda tépida e aliciante dos pares em torvelinho sob o colorido das serpentinas e os vapores da champanha, estais acaso insensibilizados pelo bacilo de Hansen que vos eteriza a epiderme, ao ponto de não sentirdes o contato morno dos pares conchegados? Este baile é então um festim de eunucos ou algum místico entoar de matinas e laudes ao bruxuleio das lâmpadas sob vitrais em que o crepúsculo transcendentaliza a doçura claustral?

Tudo em vós, ou explícita ou implicitamente, são pensamentos voluptuosos, em cuja corrente boiam as formas corpóreas esplêndidas e vivas, com maciezas ondulantes e curvas harmoniosas de Astartéias ou masculinidades ostensivas ou equívocas de Narcisos e Ganimedes. Ora, se esses são os pensamentos ocultos em vossas cabeças, porque os não quereis ver objetivamente?

Ouso dizer-vos, senhores, senhoras, rapazes e mocinhas, o que nem por sombras podereis supor. E é o seguinte: esta nudez completa, sem disfarces, é mais casta e mais pura do que as vossas roupas e as vossas atitudes.

A nudez, em si mesma, não é imoral. Se o fosse, não estariam nos altares a imagem de São Sebastião, as dos anjinhos barrocos a encimar frontarias de nichos e relevos de colunas e de púlpitos, e a do próprio Cristo pregado na sua Cruz. A atitude de dor do capitão romano varado pelas flechas, a de inocência dos anjos, a de misericórdia do Redentor de braços abertos, como que animam a nudez de uma eurritmia sagrada, de uma expressão divina.

O Apolo do Belvedere, a Vênus de Milo, o Adão da Capela Sistina, estão nus e há neles a castidade das expressões naturais.

O que torna imoral o nu são as intenções que nele se refletem, os pensamentos secretos que o animam. No meu caso (diz a dançarina expulsa pela assembleia do Municipal) o que vos escandaliza não é o nu do meu corpo, mas sim a lascívia que ponho nos ritmos com que interpreto tudo quanto se passa nas vossas almas. Sois como os velhos de Babilônia, que denunciaram Suzana porque a viram nua no tanque, por entre as frestas das árvores. Não era contra a nudez da formosa israelita que eles se revoltavam, mas contra a lascívia que requeimava o sangue decrépito e que dava intelectualmente ao corpo da banhista a própria expressão subjetiva de suas imaginações doentias.

Notai que Suzana banhava-se às ocultas, recatadamente. E vós? Não ides à praia publicamente? O simples fato de vos exibirdes não transfigura o vosso nudismo em ostentação das vossas formas, e se nessa ostentação sentis algum prazer, que nome dareis a esse prazer? Eu o chamarei a delícia de mostrar-se e a essa delícia chamarei deleite luxurioso. Etimologicamente, luxúria quer dizer exuberância, ostentação, transbordamento, expansão. Ora, quem se mostra, exubera, ostenta, transborda, expande-se e nisso há secreto gozo.

Além do mais não há apenas o deleite subjetivo de quem exibe e o faz com artes de provocar; há o gosto dos que veem e sobre as fantasias objetivas engendram outras tantas pelo poder da imaginação.

Olhar é uma forma de apoderar-se. Tanto assim é que se pagam entradas nos cinemas, onde as fitas são alugadas aos olhos; e, em certas galerias de arte, onde os quadros e as estatuetas são alugadas à vista.

Olhos nada levam, dizem os espíritos superficiais. Eu vos asseguro que os olhos levam muito. Levam a imagem estampada no cérebro e se isso não for uma forma de posse, não sei o que seja possuir.

Mas o nu não está somente no alienar a roupa. Uma pessoa pode estar vestida e estar moralmente nua, do mesmo modo que uma pessoa pode estar nua, como as Virgens cristãs levadas ao suplício, e estarem moralmente vestidas.

Tenho a coragem de vos dizer, a todos que vos fantasiais de colombinas, arlequins, ciganas, baianas, havaianas, que estais tão nuas como a minha nudez, isto é, como a lascívia que a minha nudez põe na cadência de minha dança.

Nem mesmo a vossa dança é diferente da minha. Também, como eu, não tolerais hoje a delicadeza das valsas e das mazurcas. Os vossos médicos dirão que aquelas danças não passavam de sublimação do instinto sexual e em nosso tempo já possuis as válvulas de extravasamento daquilo que nossos avós chamavam sem-vergonhice e os esculápios denominam complexos: são as danças da regressão atávica, operando no campo da medicina moderna o mesmo que os juristas praticam refundindo as normas do direito internacional e revogando princípios jurídicos e éticos, para retrogradar a humanidade até à pedra lascada. Essas danças nada têm de comum com os ritmos harmoniosos da Grécia Antiga, nem com o ritmo coreográfico e quase litúrgico do velho Oriente; nem se parecem com os inocentes folguedos populares dos países cristãos; nem se aproximam da poesia e da graça do Romantismo que iluminou de sonhos e de suaves emoções o século XIX. Não: são danças inspiradas nos selvagens da África e oriundas do cruzamento psicológico de brancos e pretos da América do Norte. Essas danças não procuram o sentido da harmonia e da musicalidade delicada e espiritual; elas são diretamente sexuais e desbragadamente lascivas.

Qual a diferença entre as vossas havaianas de umbigo de fora e as vossas baianas mirandescas e esta nudez luxuriante com que me apresento? Qual a diferença entre o ritmo das vossas músicas e o ritmo do meu corpo nu? Qual a diferença entre os pensamentos dos vossos cérebros excitados pela champanha, pelo éter, pelo odor de mulheres e homens, e a realidade que exponho aos vossos olhos?

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E a dançarina desnuda, no ritmo da dança parece concluir:

- Puritanos! Fariseus! Ide, primeiro, compor vossas almas e depois julgai-me

Porque não será expulsando-me que modificareis um milímetro o vosso degradante mundo, os vossos costumes hipócritas, elevando, como seria de desejar-se numa sociedade cristã, a moralidade do povo brasileiro!

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SALGADO, Plínio. O Espírito da Burguesia. 1ª edição. Rio de Janeiro: Livraria Clássica Brasileira, 1951. Transcrito da página 165 até 178.

Liberdade, Caminho da Escravidão (1934)


Plínio Salgado

Todos os sofrimentos do mundo moderno se originam de um só defeito da grande máquina: a falta de disciplina.

O conceito da liberdade excessiva, o predomínio do individualismo mais desenfreado determinou o desequilíbrio social que perturba o ritmo da vida do nosso século.

Desde a Revolução Francesa, outro não tem sido o grito da humanidade, senão aquele que atroou todos os recantos do mundo e do século:
- Liberdade! Liberdade!

E foi a liberdade que espalhou pelas nações as doutrinas mais contraditórias, as afirmativas mais absurdas, os brados mais lancinantes de angústia do pensamento e do coração.

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Liberdade! Clamava o homem e, clamando, tratava de conquistar os meios com que pudesse exercer, com forte base econômica, a faculdade de ser livre.

Foi assim que se formaram os primeiros capitais da avareza.

Liberdade! Clamavam os banqueiros, e foi assim clamando que dominaram as Nações, escravizaram as indústrias e o comércio, humilharam os produtores.

Liberdade! Clamavam os industriais e comerciantes e, entregues às leis da concorrência, livraram-se da disciplina do Estado, mas caíram no cativeiro dos agiotas.

Liberdade! Clamavam os patrões, e, em nome da liberdade de contrato, passaram a explorar os pobres, e o trabalho humano transformou-se em mercadoria sujeita às leis da oferta e procura.

Liberdade! Clamavam, por sua vez os proletários, os quais, assistindo ao espetáculo de luxo e paganismo de seus chefes, endureceram o coração e lançaram-se nas tremendas lutas de classe, feitas de ódio e de revolta.

Liberdade! Clamavam os pais, os esposos, os filhos, e ruiu a estrutura dos velhos lares felizes e tranquilos.

Liberdade! Clamava a imprensa, e na livre concorrência comercializou-se ao gosto depravado das turbas, que precisou agradar, e dos argentários, aos quais precisou vender-se.

E, em nome da liberdade, o gênero humano caminha para a ruína total, destruindo o ritmo de sua existência com a morte da disciplina.

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A indisciplina destrona a modéstia e erige em ídolo a vaidade e o orgulho; transforma o amor em puro instinto sexual; reduz a amizade a uma questão de oportunidade; considera a honra como um ponto de vista; examina os costumes como relatividade de conveniências; semeia ódio sobre a terra; cria uma civilização de rebelados.

Já o homem não sabe defender-se dos vícios. Libertando-se da disciplina do espírito, cai na escravidão dos instintos.

O homem, agora, é livre. Livre de todos os preconceitos. Não tem sentimento nem religioso nem cívico. A Pátria, que é a Pátria, depois que lhe deram a significação meramente política de “vontade geral”? A Pátria é uma convenção.

Assim julga a mentalidade capitalista. Assim também a imagina a classe operária.

É que a Pátria, ela mesma, é uma expressão de disciplina. E, tendo desaparecido a disciplina, desaparece a Pátria.

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Desta forma a humanidade marcha até a Grande Guerra. Culmina no seu grande delírio e desce, agora, a encosta dolorosa da desilusão, da tristeza surda, da insatisfação.

Essa insatisfação não se aplacará em qualquer regime, seja ele qual for.

O próprio comunismo é uma ilusão. Pois devendo impor uma atroz disciplina, virá contrariar o individualismo, que atualmente busca nele o derivativo máximo.

Liberdade! Liberdade! Nunca o gênero humano foi mais infeliz! Nunca foi tão prisioneiro...

Nem mais escravo.

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E a Liberdade é o supremo dom do homem. É a dignidade da nossa Espécie. É a alegria dos nossos movimentos. É nossa honra e nossa glória, nossa aspiração superior.

Quem a degradou assim? Quem a tornou uma enfermidade e um opróbrio?

O Liberalismo.

Como salvaremos a Liberdade?

Pela disciplina.

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SALGADO, Plínio. O Soffrimento Universal. 3ª ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1936. Transcrito das páginas 185 até 190.

Este texto pode também ser acessado no formato de áudio-livro: http://aquartahumanidade.blogspot.com.br/2017/02/liberdade-caminho-da-escravidao-1934.html

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

MENSAGEM NA SEMANA HEROICA (1935)


Plínio Salgado

No meio das tremendas lutas em que nós, Integralistas, nos empenhamos no ardente desejo de criar a Nação Melhor;
Por entre as perfídias, ironias, sarcasmos, injúrias, mentiras, calúnias, sofismas, perseguições e violências que se mobilizam para humilhar-nos, ferir-nos, oprimir-nos;
por entre as confusões e as dúvidas do momento atual, os sobressaltos de cada instante que no seio das famílias sopram como ventos álgidos;
diante do espetáculo de dissimulações, de dolosas reservas, de silêncios criminosos, falsas palavras, vagas ameaças, traições e ruínas da hora presente;
- eis que é preciso, durante, ao menos uma hora, dessarilhar armas, folgar sentinelas ao mundo exterior, aplacar este elã revolucionário que nos impele para meditarmos um pouco sobre Aquele cuja morte comemora esta semana toda a Cristandade.

Abstrair um pouco dessas preocupações de lutas concretas iminentes, de perigos inevitáveis, de maldade dos que, para combater-nos, não escolhem armas, das conjurações de que nos cercam os inimigos da Pátria, e volver os nossos olhos para dentro de nós mesmos, para aí surpreender novas legiões de inimigos do nosso próprio Ideal.

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Quando penso que a massa Integralista, constituída hoje de mais de 400.000 homens, é feita do mesmo barro humano de que são feitos os nossos adversários. E que só a vaidade estúpida nos poderá insinuar que somos diferentes;
quando considero que pesa sobre esse verdadeiro exército de Camisas Verdes a responsabilidade muito maior, a dos que tiveram ocasião de se aproximar mais de perto da verdade e da graça que Deus nos deu de compreendermos as causas desses horríveis efeitos da anarquia social;
quando medito sobre isso, ó Camisas Verdes, sinto que os nossos mais temíveis adversários são as nossas próprias condições humanas, a rebelião dos nossos instintos, a tendência desagregadora que temos de conter, com vontade de aço, em nosso próprio mundo interior.

Estas são as minhas palavras na Semana Heroica. Este é meu grito de sentinela dentro da noite carregada de trevas do Desconhecido Mundo, do Ignorado Universo em que refervem as larvas do limbo da terra de que proviemos, na escuridão dos nossos tenebrosos mistérios interiores.

Estas são as minhas palavras, como as sirenes das naves na cerração traidora; como o alarme do sineiro na noite tétrica; a voz do aviso...

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Esta Revolução Integralista é, principalmente, dirigida contra nós mesmos. É um movimento de libertação. Que cada um se liberte de si próprio. É movimento de humanidade. Que cada um procure se conhecer e corrigir. É movimento de patriotismo. Que cada um procure um modelo de vida mais adequado à harmonia social e à felicidade nacional. É afirmação de espiritualismo. Que cada um conheça as cadeias que o prendem à tirania da matéria, para se livrar delas na ânsia suprema do infinito.

Se este movimento Integralista pretende salvar o nosso Brasil, se pretende fazer dele a Grande Nação objetivadora das supremas finalidades do Homem, cumpre, ó Integralistas, que conheçamos a fundo as causas das desgraças que se abatem sobre nossa Pátria, procurando combate-las, não somente no que vemos em redor de nós, porém, muito mais, no que existe dentro de nós.

Esta é a Semana do Sacrifício. Sacrifiquemos as nossas vaidades. Esta é a semana das meditações: meditemos sobre as enfermidades morais do mundo e do nosso país.

O mundo está doente de covardia e traição. O mundo está roído de orgulho e de rebeldia. O mundo está engorgitado de cólera e despeito.

A reunião de Stresa será nos séculos vindouros considerada ridícula e reveladora de um estado de espírito mórbido, tão mórbido como o pavor recíproco da Inglaterra, da Rússia, da Alemanha, da França e da Itália.

Ninguém mais acredita na letra dos tratados, na ordem interna dos povos, na ordem externa, internacional. A China está em chamas; descem no solo da África as legiões romanas do Fascio; a América do Sul está incendiada e ensanguentada; a Rússia mantém o maior exército do mundo; a Alemanha se arma e o Japão se prepara. Todos se temem, nas relações internacionais. Ninguém fala a verdade. A diplomacia é ainda a velha arte de enganar. A economia está nas mãos de grupos particulares jogando com a sorte do mundo. A imprensa, o cinema, o rádio, todas as formas de publicidade, ao serviço do espírito das trevas, da confusão, da mentira e do escândalo. Os povos se desesperam. No desespero, armam-se. A luta se prepara mais terrível do que nunca.

E, enquanto isso se passa no mundo, como vai nosso país? Nosso Brasil vive o instante mais triste, mais desmoralizador, mais tenebroso. Entramos na época do despistamento. Nunca a política foi mais pérfida, mais perturbadora nas suas tramas, mais indigna na falta de cumprimento de seus compromissos, mais torpe nas suas conspirações e nas suas desumanidades.

Nunca se viu um tempo tão escuro, em que já não se pode escrever o que os homens falam, nem se pode confiar naquilo mesmo que eles escrevem. Chegamos a tal ponto que se criaram duas sortes de opiniões e pareceres: uma para efeito da imprensa, outra apara efeito particular. Mas as próprias opiniões particulares se dividem em duas castas: uma para iludir, outra para enganar. De sorte que já ninguém confia, ninguém fica tranquilo a respeito da palavra de seu semelhante.

Ilude-se o povo diariamente. Inventam-se mentiras que ele engole; injúrias e calúnias que o envenenam e boatos que o animam ou aterrorizam. As correntes políticas se infiltram mutuamente. Multiplicam-se os espiões. Proliferam os segredos e cochichos. Agitam-se as ambições, as vaidades, os orgulhos. Hipertrofiam-se os personalismos dissolventes. O medo recíproco arma ciladas recíprocas. Os recíprocos ódios preparam botes mortíferos. O cinismo impera. A aflição popular aumenta. A desilusão fere os menos maus. O ceticismo anula os esforços. O materialismo cai sobre todos como um crepúsculo.

Esse é o panorama da nossa Pátria.

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E, pois, que os Integralistas se propõem, no meio de tudo isso, impor ordem à Nação, iniciar uma época de reabilitação de cada um e de todos, é necessário que cada Camisa Verde se coloque em atitude de penitencia diante do Eterno, pedindo-lhe para sua fraqueza, energia; para a sua vaidade, humildade; para seu ódio, coração limpo; para suas ambições, capacidade de renúncia; para seu instinto de prazeres materiais, a aspiração de alegrias superiores.

Camisas Verdes, fazei a revolução interior. Não confieis em vós mesmos, porém, nas virtudes da raça e na graça do Altíssimo. E uma vez que não há modelo na terra que vos sirva de padrão para vosso esforço no rumo do “perfeito”, lembrai-vos do Inocente que foi pregado na cruz. Ele é o cordeiro que tira os pecados do mundo. Só ele nos poderá indicar os seguros caminhos. O mundo esqueceu-se dele. Por isso é que o mundo está morrendo de medo recíproco. Todos os pactos internacionais exprimem a covardia do século. Toda a agitada, dolorosa e humilhante vida nacional que vivemos, entre traições e misérias incríveis, origina-se das mútuas ambições, dos mútuos ódios, das perfídias e felonias recíprocas, da falta de coragem, enfim, para dizer alto o que se pensa.

Ora, toda lição de coragem está na morte do Nazareno. Porque a verdadeira coragem não é sair armado para encontrar outro homem armado, mas é sair desarmado para morrer. O Integralismo que está na rua, desde o Manifesto de Outubro, não sairá das ruas, em hipótese nenhuma, disponha dos elementos que dispuser, encontre-se em que circunstâncias se encontrar, tenha que enfrentar as perseguições que vierem; haja de contar com as incompreensões que surgirem; com as infâmias que lhe assacarem, com as calúnias com que o ferirem e com as violências com que pretenderem abate-lo.

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Se o mundo está morrendo de medo e se nossa Pátria está definhando de terrores generalizados, onde poderemos ir buscar coragem senão n’Aquele que foi o mais corajoso e que perguntou a Pedro, quando este fugia de Roma: “Para onde vai?”

Se os homens se calam de medo uns dos outros, é preciso que falemos claramente a cada um e a todos em conjunto, sempre as mesmas coisas e cada vez mais nítidas.

Se os homens usam a técnica do despistamento, inauguremos a técnica da franqueza. Se as coisas neste país se concertam nas trevas, concertaremos as nossas à luz do sol. Que queremos nós? Uma Pátria cristã; paz nacional pela função política das corporações; o respeito à autoridade oriunda não das trevas das revoluções e das traições à palavra dada, mas oriunda das claras e solares campanhas de formação da consciência popular; a disciplina nacional; o prestígio do Brasil no Exterior; a consciência do dever para cada um, da dignidade e liberdade da pessoa humana; a grandeza da Nação, fundamentada na trilogia sagrada: - Deus, Pátria e Família. Acaso constituirá isso um crime? Se é crime, a Pátria Brasileira já foi dissolvida; se tal não se dá, por que temermos? E se falarmos sempre a verdade, se não iludirmos nosso próximo, nem a nossa consciência, tenhamos certeza, ó Camisas Verdes, que os olhos dos nossos adversários não verão, mas os olhos de Deus nos enxergam no fundo de nossos espíritos e é a Ele que teremos um dia de dar contas de quanto fizermos e de quanto pensarmos.

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Para fazermos tudo isso, poderemos confiar exclusivamente em nós? Que vaidade imbecil terá entrado no coração Integralista que possa levá-lo a exclamação: eu sou perfeito! Ninguém é perfeito neste mundo e o mais que poderemos fazer é nos julgarmos diariamente com severidade antes de julgarmos o próximo. E pedirmos à Energia Eterna, à Soberana Vontade que nos dê fortaleza para imitarmos, ao menos de longe, o modelo de todos os modelos, a luz de todas as luzes.

Essa batalha tremenda nós só poderemos ganha-la contra nós mesmos, pela meditação diária, na hora dos profundos silêncios e desamparadas solitudes, sem outro ponto de referência senão nossa própria luz interior, acerca da vida d’Aquele que foi injuriado pelos maus, que foi guerreado pelos políticos do tempo, que foi caluniado como perdulário por Judas Iscariotes, como comilão e beberrão, pelos fariseus escandalizados porque Ele se sentava à mesa dos publicanos, como desordeiro violento, pelos mercadores do Templo, como transgressor das leis de Moisés, pelos Sumos Sacerdotes, como inimigo das tradições nacionais pelos escribas, como revolucionário, anarquista, charlatão e louco, pelas autoridades romanas.

A linha do equilíbrio entre a justiça e a misericórdia, entre o coração e a razão, entre a bondade e a violência, entre a brandura e a energia, entre o perdão e o castigo, entre a humildade e a autoridade nunca teve um desvio de milímetro na vida extraordinária do Inocente imolado aos pecados do mundo.

Integralistas, eu sei que sois fracos, sei que ainda não sois Integralistas, sei que estais longe do que desejamos todos ser. Eu sei, Camisas Verdes, das vossas inquietações e dos vossos remorsos, quando verificais que não estais procedendo integralisticamente.

Que sabemos nós? Que somos nós? Que nos falta? Como proceder de modo a sermos Integralistas capazes de realizar a Grande Revolução?

Não julgueis, Integralistas, que eu não vos conheça, um a um, desde os mais graduados aos mais obscuros. A circunstância do lugar onde me encontro na direção do nosso movimento me oferece os dados acerca de todos vós. E, em verdade, penso que muito deveis de vos esforçardes para que consigais merecer o título de Integralista.

Nesta Semana do Sacrifício e do Heroísmo, a Semana da Morte de Jesus, da sua Paixão, pensei muito em vós e em mim próprio. Pensei em nosso Brasil.

Agora, que dois mil anos se passaram, e que vemos o espetáculo da Idade Contemporânea, todas as desgraças e todos os desesperos que desabam sobre os povos, como furacões e terremotos, compreendemos bem as causas das infelicidades universais e nacionais. Elas se originam, exclusivamente, da nossa pouca atenção, do nosso esquecimento, acerca dessa Vida, que é modelo de indivíduos, de famílias, de nacionalidades e de humanidade.

Camisas Verdes! Possa o nosso Brasil, na alvorada de uma ressurreição, no milagre de um movimento que pertence menos a nós que aos Desígnios Eternos, levantar-se na glória de um Grande Império, iluminado pela verdade imortal, e tendo nas mãos a chave dos segredos políticos e sociais que, afinal de contas, é modelada pela mesma pequenina chave com que cada um de vós, à força de meditação e de sacrifício, de coragem e de fé, abrirá as portas misteriosas do próprio coração.

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Publicado em “A Offensiva”, Rio de Janeiro, Ano II, Nº 49, 20 de Abril de 1935, páginas 1 e 2.